Mas a verdade é que grande parte do câncer de fígado (em estágio primário) é provocado pelas hepatites virais B e C, afirma presidente do Ibrafig
Recentemente, a pedido do Instituto Brasileiro do Fígado (Ibrafig), o Instituto Datafolha produziu uma pesquisa sobre o câncer de fígado. E para a maioria dos brasileiros a doença é secundária, e provocada principalmente pelo consumo abusivo de álcool e cigarro.
Apesar desse achismo, a verdade é que, segundo o presidente do Ibrafig, o hepatologista Paulo Bittencourt, este dado não condiz com a realidade. Grande parte do câncer de fígado (em estágio primário) é provocado pelas hepatites virais B e C.
O médico explica que estas doenças são tratáveis e que podem ser prevenidas. Mas o fato é que a população brasileira não dá a devida atenção e, consequentemente, não se previne sobre este tipo de câncer.
Câncer de fígado e as hepatites virais
As hepatites virais correspondem à metade dos casos de câncer hepático primário, conhecido como carcinoma hepatocelular. Porém, elas podem ser detectadas com testagem gratuita e ainda com tratamento na rede pública, fornecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
O perigo de uma doença silenciosa
Por outro lado, o presidente do Ibrafig explica que essas doenças são completamente silenciosas. Ou seja, as hepatites virais e o câncer de fígado em estágio primário não causam nenhum tipo de sintoma.
“O câncer de fígado, quando ele se manifesta, do ponto de vista clínico, geralmente já está em fase muito avançada, onde o tratamento curativo não é mais possível.”
Diagnóstico precoce
Quando diagnosticado no início, o câncer de fígado pode ser tratado por cirurgia e por radiologia intervencionista. Mas em quem tem cirrose, será preciso fazer um transplante de fígado. Por outro lado, quando o diagnóstico é feito tardiamente não existe tratamento terapêutico, apenas cuidados paliativos, revela Bittencourt, que enfatiza que hoje isso ocorre em dois terços dos brasileiros.
Vale lembrar que no mês passado, o primeiro transplante de fígado bem-sucedido do Brasil completou 36 anos. A cirurgia teve a participação do Dr. Sérgio Mies e foi realizada no Hospital das Clínicas de São Paulo.
Como foi a pesquisa
Realizada de 8 a 15 de setembro, a pesquisa ouviu quase 2.000 pessoas maiores de 18 anos de idade, residentes de 129 cidades das cinco regiões do Brasil.
O levantamento constatou que apenas 40% dos entrevistados já tinham feito teste para hepatites virais. Mas os que nunca fizeram o teste, ao serem indagados, responderam que o motivo era por não sentirem nada e muito menos algum tipo de sintoma associado ao fígado. Além disso, a pesquisa afirma que oito em cada dez brasileiros sabem que os testes para hepatite B e C são realizados gratuitamente pelo SUS. Entretanto, 46% não faz o teste por pura falta de interesse, e 47% por não sentir necessidade nem dor.
Datasus
Já dados do Datasus (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde) mostram que 70% das pessoas com câncer primário de fígado no país têm diagnóstico na fase terminal, com média de sobrevida de apenas três meses.
“Ou seja, as pessoas não fazem o teste que é recomendado para todo mundo acima de 40 anos, que é a hepatite C, principal causa de câncer primário de fígado, porque não têm sintomas, mas não sabem que a doença pode ser inteiramente silenciosa e, quando se manifesta, já pode estar associada a uma redução importante de sobrevida e de impossibilidade de tratamento curativo.”
Alcoolismo e cigarro
Bittencourt diz ainda que a população se engana quando pensa que o câncer de fígado é provocado pelo em excesso de álcool e tabagismo. No entanto, o hepatologista admite que quem não bebe e não fuma possui risco menor de ter cirrose e de ter câncer de fígado.
Pandemia
O hepatologista diz que o país possui um plano de eliminação das hepatites virais junto à OMS (Organização Mundial da Saúde). Todo o tratamento é custeado pelo SUS, incluindo testagem. Mas pandemia fez este quadro piorar, gerando “um impacto negativo absurdo”.
Pelo fato de o câncer de fígado acometer, principalmente, quem tem cirrose, é preciso ser feito um rastreamento com ultrassom de nódulos a cada seis meses. Portanto, por conta do distanciamento social, muitas pessoas não realizaram exames preventivos.
“Isso foi inteiramente desarticulado na pandemia. Quem não fez os exames preventivos e suas consultas nos últimos dois anos, quer fazer agora tudo de uma vez. Com isso, os laboratórios públicos estão todos abarrotados e não vai ter vaga para atender todo mundo. A consequência é o aumento de brasileiros com câncer de fígado. E de pacientes com câncer de fígado em fase avançada.”
Conscientização
No dia 13 de outubro, o Ibrafig participou do lançamento da campanha mundial de conscientização sobre doenças do fígado. Nas redes sociais do instituto já há posts que esclarecem sobre os fatores de risco para este tipo de câncer.
Conforme dados da OMS, quase 296 milhões de pessoas vivem com hepatite B no mundo e 58 milhões vive com hepatite C1. Bittecourt relembra que para a hepatite C existe cura, e que para a hepatite B já tem uma vacina eficaz e segura.
Por fim, o Ibrafig integra uma força tarefa global para eliminação das hepatites virais até 2030, em parceria com a OMS, e também participa de campanhas públicas de conscientização sobre o câncer de fígado. Neste ano, o instituto entrou para a International Liver CâncerNetwork.
Quem quiser acessar dados e mais informações, o Ibrafig disponibiliza o número de telefone 0800 882 8222. Por meio dele é possível saber locais de testes para hepatites virais na rede SUS, além de envio de material educativo e formas de prevenção de doenças do fígado.
*Foto: Unsplash/National Cancer Institute